domingo, 5 de setembro de 2010

VALE-TUDO

De eleições brasileiras, sabemos todos, pode-se esperar de tudo. Na década de cinquenta, quando ainda não havia a cédula eletrônica e o eleitor escrevia sobre um papel próprio o nome do candidato de sua preferência, o “candidato” Cacareco, que era um hipopótamo do Zoológico de São Paulo, arrebanhou cerca de 100.000 votos, numa clara manifestação do desgosto popular quanto ao baixo nível dos candidatos. Foi assim mesmo, alguém lançou Cacareco a vereador e ele obteve mais votos do que o segundo candidato colocado, este autorizado, com cerca de 95.000. Passados mais de cinqüenta anos, nem tanto mudou nas cenas dos sucessivos sufrágios. Não bastasse sermos obrigados a conviver com o horário político obrigatório pela TV e pelo rádio, e assim nos darmos conta do grau de mediocridade de tantos candidatos que em pouco estarão sentados lá nas câmaras dos representantes do povo, somos ainda obrigados a votar. E com a desvantagem de não podermos, por via eletrônica, expressar nossas reais opiniões sobre o grande circo eleitoral, por exemplo, preferindo o Cacareco a tantas nulidades. E escrevo isso com certa vergonha, porque na realidade nunca anulei voto, nunca votei em branco e sei que somos responsáveis por nossas escolhas, mesmo que dentre elas figure um Cacareco. Mas o pior desta vez leva outro nome. Chama-se promiscuidade. Explico com a ajuda do Dicionário Houaiss, que entre outras definições mais conhecidas aponta para aquela que designa: 2. mistura confusa, desordenada. Chegamos ao ponto que passou do vira-casaca, figura tão conhecida da política, quando um candidato sai da extrema esquerda para a extrema direita, ou desta para aquela, indo assim, do zero ao infinito, como numa mera equação de cálculo integral e diferencial. Agora alguns candidatos, ancorados em duplicidades ideológicas - acendem simultaneamente uma vela ao santo e outra ao diabo, as duas no mesmo castiçal da incoerência. Quase todos interessadas na carona da influência da marola do presidente brasileiro - queira-se ou não - com forte aprovação popular. Os que não estão nesta barca - porque por coerência não poderiam estar - singram na nau dos desesperados. E a baixaria dos palanques assume níveis já antes vistos, mas desta vez de ambos os lados beirando a insensatez de quem acusa e a cara de pau de quem nega. É para isso que servem os dossiês que estão a merecer neste país de língua portuguesa um novo significado. E la nave và. Quanto à imprensa, é difícil encontrar um jornal ou uma revista que não expresse sua preferência por a ou por b de forma escancarada. Em alguns casos vergonhosamente, desdenhando a sabedoria do povo, omitindo notícias relevantes ou fortalecendo a invenção de outras de seu interesse próprio. Articulistas brilhantes emprestam seus talentos ao jogo sujo da promiscuidade, às vezes extrapolando vias racionais usualmente aceitas pelo bom senso comum. Então, seja qual for o resultado, tudo voltará ao statu quo ante, porque isso faz parte do jogo depois da tempestade. E la nave và...

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